Esquecidas pela indústria farmacêutica, mas capazes de fazer milhões de vitimas mundo afora, doenças como malária, dengue e leishmaniose podem ganhar vacinas em até dez anos. Este é o objetivo do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Vacinas, que encerra hoje um seminário de três dias no Rio.
Três anos atrás, o órgão, que reúne pesquisadores da Fiocruz, UFRJ, USP e UFMG, assumiu como objetivo o estudo de mecanismos de defesa contra as chamadas doenças negligenciadas. Os trabalhos desenvolvidos desde então seguem avançados — alguns já fazem testes em primatas, última etapa antes de levar os experimentos para testes em humanos. Mas, para prosseguir os estudos pelos próximos dois anos, será necessário um financiamento de R$ 12,5 milhões do governo federal.
- Só agora, com o desenvolvimento dos países em que essas doenças são comuns, o interesse de algumas companhias farmacêuticas aumentou - explica Ricardo Gazzinelli, pesquisador do Centro de Pesquisas René Rachou. - Foi constatado, enfim, que existe um mercado.
A leishmaniose é a doença com resultados mais avançados. Desde 2008 está disponível uma vacina para cães - contaminados pelo mosquito-palha, o mesmo que, logo depois, infecta também o homem.
- O cão é o reservatório dos parasitas - explica Ana Paula Fernandes, bióloga da Faculdade de Farmácia da UFMG. - Conduzimos uma série de estudos para comparar os antígenos, as substâncias que desencadeiam a produção de anticorpos, e um deles se destacou na produção de uma resposta imune.
Para uso em humanos, a vacina teria de passar por adaptações. E a mudança é urgente. Até a década de 90, quase todos os casos ocorriam no Nordeste. Hoje, aquela região responde por apenas metade das ocorrências. A doença avançou para estados onde nunca havia sido registrada antes, como Minas Gerais, Goiás e Espírito Santo.
- Está praticamente fora de controle - diz Ana Paula. - Essa expansão deve-se à migração das famílias, que levam cães infectados, e à urbanização e ao desmatamento, que fazem o mosquito-palha multiplicar-se com ainda mais facilidade.
A doença causa febre prolongada e provoca anemia, tosse, diarreia e perda de peso. Cerca de 20 mil pessoas são infectadas anualmente pela leishmaniose no Brasil. Um número muito inferior ao da dengue - que, na epidemia de 2008, deixou mais de 1 milhão de vítimas. O desafio é produzir uma vacina que proteja dos quatro sorotipos virais, todos já em circulação no país.
Um dos rumos estudados é a imunização combinada de vacinas de DNA e um vírus quimérico - formado por pedaços de mais de um vírus. No caso, daqueles responsáveis pela febre amarela e pela dengue.
- No Brasil, já temos tradição na produção de febre amarela - lembra Myrna Bonaldo, bióloga e pesquisadora do Instituto Oswaldo Cruz. - Estamos observando, nos primatas, como cada sorotipo se prolifera e se um deles é dominante.
Na malária, a diversidade de “raças” também é um desafio para os pesquisadores. Ou seja, uma vacina contra o Plasmodium vivax, que infecta até 400 milhões de pessoas anualmente no mundo, teria de abranger todas as cepas de parasitas descritas. Quatro proteínas estão sendo desenvolvidas e foram apontadas como possíveis candidatas a esta vacina universal. A doença, letal em muitos casos, provoca febre alta, dores de cabeça e hemorragias.
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