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Nossa justiça é realmente justa?
13 de abril de 2009
Quanto tempo ficaria em vigor uma lei se ela decretasse que, para combater a Dengue, fossem mortas todas as pessoas com sintomas dessa doença? Essa lei seria justa?
Imagine que você toma todas as providências para conter o mosquito da dengue, mas um vizinho egoísta não cuida de seu quintal, proporcionando as condições para que o mosquito da dengue se desenvolva. Então, um dia você fica com febre, vai a um posto de saúde e um médico local decreta: você está com suspeita de dengue. Nesse dia, o governo o condena à morte. A polícia imediatamente vai à sua casa e o algema. Você é levado à força para o local onde será feita sua execução, sem direito a tratamento e sem direito a reclamar.
Pois saiba, essa lei está em vigor desde 1963. Se você concorda com essa lei, se você acha que ela é justa, por favor, encerre aqui sua leitura.
A lei em questão, mais precisamente o decreto aprovado pelo senado federal nº 51.838 de 14 de março de 1963 existe mesmo, mas seu alvo não é a dengue. Ela tem como alvo outra doença: a Leishmaniose, também conhecida como Calazar. A leishmaniose é causada por um parasita e provoca febre, perda de peso, anemia, inchaço do fígado e baço, e possivelmente derrames. Se a moléstia não for tratada pode levar à morte.
A leishmaniose tem algumas semelhanças com a dengue. É transmitida por um mosquito: O mosquito-palha. É transmitida quando o mosquito pica um portador do parasita e se contamina, passando o parasita adiante a cada nova picada. Também poderia ser prevenida com a educação da população, e com o combate ao mosquito vetor da doença, que se desenvolve em locais onde há restos orgânicos em decomposição, como fezes de animais, galhos e folhas. Seu diagnóstico também é bastante difícil e impreciso.
Diferentemente da dengue, apesar do tratamento, a doença não tem cura. O tratamento porém pode oferecer vida normal ao portador da doença. Felizmente, diferente da dengue, existe uma vacina contra a doença. Ah sim, um detalhe: pesquisas indicam que os portadores da leishmaniose podem ser os homens, alguns roedores e animais da família dos canídeos, na qual estão incluídos nossos melhores amigos: os cachorros. Segundo apontam essas pesquisas, todos eles podem ser portadores do parasita e permitir ao mosquito-palha retransmitir a doença.
Mas o que deveria ser um detalhe, aos olhos egoístas do humano que faz as leis, tem provocado um verdadeiro assassinato em massa. A lei deveria proteger os indefesos, dar voz às minorias. Mas a cega justiça não é capaz de acompanhar a racionalidade e a ciência: o decreto em questão tem como alvo apenas os cachorros.
Isso ainda está ocorrendo no Brasil. Digo “ainda” porque o Brasil é um dos únicos países do mundo onde ainda se pratica essa barbárie. Em todo nosso país, milhares de cães diagnosticados como suspeitos de leishmaniose tem sido sacrificados sumariamente, em contradição com a própria ciência, pois o nosso país é um dos pioneiros no planeta nas pesquisas das vacinas contra a leishmaniose.
O descaso do governo e da população humana com a prevenção permitiu que essa doença avançasse do interior aos grandes centros urbanos. Os meios de comunicação que deveriam informar a população fazem o contrário: criam um clima de terrorismo e levam a população a temer aqueles que sempre foram seus companheiros. Nas clínicas veterinárias, a leishmaniose é rebatizada pelos donos dos animais: agora ela é a “doença de cachorro que mata gente”. Então, mais uma vez usando da força ao invés da racionalidade, o governo é obrigado a tomar medidas, mostrar ação, mesmo que essa ação tenha apenas efeitos negativos. O governo envia funcionários do Controle de Zoonoses para colher o sangue dos animais nas casas das pessoas das regiões onde ocorre esse terror. Algum tempo depois, os funcionários voltam, dizendo que o animal está doente e que deve ser sacrificado. Retiram o animal e desaparecem, deixando em seu lugar apenas um papel oficial com o resultado do exame: título de 1:40 – REAGENTE.
O proprietário atônito não consegue nem chorar diante do choque causado. As crianças entram em desespero ao verem seus amigos sendo levados por um estranho e não conseguem nenhuma explicação de seus pais, que se sentiram impotentes diante do funcionário que afirmou algumas vezes, que tinha de levar o cão, nem que fosse necessário chamar a polícia.
E o próprio cachorro sente-se como nos sentimos ao ler os primeiros parágrafos desse texto: Por que meus vizinhos e meus donos não preveniram a doença? Que culpa tenho eu? Estarei mesmo doente? Não quero morrer, quero ser tratado. Ainda tem a esperança de que seu dono enfrente a lei como muitos têm enfrentado. Mas com a resignação e a humildade que é típica de sua evoluída espécie, simplesmente aceita, pois não há nada além que possa fazer.
Não bastasse toda essa injustiça e violência, ainda existe mais um fator agravante: a eficiência do exame feito para diagnosticar a doença é altamente questionável. O exame tem alto índice de falhas e gera muitos resultados como falso-positivos e falso-negativos. Isso significa que, não é porque o exame detectou a doença que o cachorro está doente. Mesmo um animal possivelmente sadio, por lei, deve ser sacrificado. E são decretados à morte centenas de animais que poderiam estar sadios em companhia de seus donos.
A única atitude aceitável no momento seria a revogação dessa lei absurda. Existem vários movimentos nesse sentido.
Não podemos esquecer também dos cães errantes, que não podem contar com o conforto de um lar e a proteção de um “dono”. Por isso, a medida mais justa seria o investimento em prevenção: O mosquito-palha deveria ser combatido. Todo cachorro deveria ter direito à vacinação para que não ficasse doente. Todo cachorro diagnosticado como doente, deveria ser submetido a exames de contraprova, para ter certeza de seu diagnóstico. Todo animal comprovadamente doente deveria ter acesso ao tratamento, para levar uma vida saudável e impedir que retransmita a doença.
Alguns ainda podem questionar o parágrafo acima, justificando que o tratamento é caro e requer monitoração constante. É verdade, concordo. Mas é uma opção ao assassinato sumário. Infelizmente, a palavra “caro” salta aos nossos olhos materialistas e soa muito alta, pois a humanidade não evoluiu o suficiente para ter com os animais um sentimento de amor familiar. Ao invés disso, tratamos os cachorros como nossa propriedade. Mas ainda assim eu pergunto: se fosse com você, preferiria ser morto ou tratado? Gostaria de ter essa escolha?
Daniel Jeremias Mello, 29 anos, paulistano, é analista de sistemas e adepto às causas ambientais. Antiespecista e vegetariano. Filho de veterinário, e entusiasta do tratamento igual entre todos os seres. Acredita que todos somos irmãos tanto do ponto de vista espiritual como científico-evolucionista.
Fonte: Anda – Agência Notícias Direitos Animais
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