Realizou-se a 18 e 19 de junho em Madrid o I Simpósio Internacional sobre Leishmaniose Canina. O evento juntou pela primeira vez médicos veterinários, médicos e investigadores para debater experiências sobre uma doença que afeta não só os cães, mas também o Homem.
“A leishmaniose é uma doença de evolução crónica que, sem tratamento, leva à morte do cão. Portugal regista uma prevalência de leishmaniose considerada elevada, com mais de 110 mil cães infetados, cerca de 6% da população canina”, refere Rodolfo Neves, da Intervet/Schering-Plough, empresa organizadora do evento. “Sendo transmissível ao Homem, podemos afirmar que os médicos veterinários têm um papel fundamental na prevenção e no garante da Saúde Pública”.
O Encontro Científico teve como objetivo debater possíveis sinergias entre médicos e médicos veterinários, nomeadamente de que formas devem lidar com as variantes da patologia, bem como conhecer o Programa de Controlo do Brasil e de que forma o país está a combater esta epidemia. Vera Camargo-Neves apresentou um estudo conduzido ao longo de dois anos no estado de São Paulo e que revelou que as coleiras impregnadas com deltametrina reduzem em 80% a incidência de leishmaniose canina e humana. Entre os especialistas presentes, Rogelio López-Vélez, médico e especialista em doenças infecciosas e em medicina tropical referiu a importância do uso de repelentes para evitar a picada do inseto que provoca a leishmaniose, doença que é “endémica em 98 países e que regista 98 milhões de novos casos em todo o Mundo e 50 mil mortes por ano em seres humanos”.
Já Guadalupe Miró, médica veterinária e especialista em Patologia Infecciosa e Parasitária, apresentou a LeishVet, uma sociedade científica registada em Espanha em 2008 e que junta especialistas da Europa e do mediterrâneo à volta da leishmaniose. “Somos um grupo de leishmaníacos com o objetivo de focar várias temáticas: diagnóstico, tratamento, controlo e estabelecer recomendações”. Luís Cardoso, docente da Unidade Curricular de Doenças Parasitárias do curso de Medicina Veterinária da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, membro do Onleish e do LeishVet, apresentou a situação em Portugal onde se regista “11,4% de prevalência nas áreas endémicas”.
Leishmaniose (Fim) - Perguntas e respostas
24/06
2011
às 21:24
1 - O que é a Leishmaniose?
Trata-se de uma doença parasitária grave causada por um parasita microscópico denominado Leishmania. É transmitida por um flebótomo – insecto relativamente parecido com um mosquito, mas mais pequeno. A Leishmaniose é uma zoonose, ou seja, pode transmitir-se ao Homem. Em Portugal, a transmissão ao Homem é pouco conhecida, mas as crianças e os adultos imunodeprimidos correm um maior risco de serem infectados.´
2 - Quais são os sinais clínicos?
O primeiro sinal clínico mais habitual é a perda de pêlo e a seborreia (caspa), sobretudo em redor dos olhos, nariz, boca e orelhas. À medida que a doença progride, o cão perde peso. É habitual o desenvolvimento de uma dermatite ulcerativa que se pode disseminar por toda a superfície corporal do cão. São também habituais feridas da pele, na cabeça e membros, principalmente nas áreas que contactam com o chão quando o cão está sentado ou deitado. Numa fase mais avançada, começam a observar-se sinais relacionados com a insuficiência renal crónica.
3 - Qual é a época de maior risco?
O maior risco de infecção está directamente relacionado com a época activa do insecto transmissor que começa com o início do calor - normalmente em Abril, estendendo-se até Outubro. Em anos mais quentes pode iniciar-se em Março e terminar em Novembro.
4 - O meu cão pode morrer de Leishmaniose?
A Leishmaniose canina é uma doença que causa invariavelmente a morte do animal. O tratamento adequado pode adiar o processo, garantindo a qualidade de vida do cão.
5 - Qual é o risco do meu cão ser infectado com a doença?Se o cão não receber qualquer protecção o risco pode ultrapassar os 20%. Esta é a percentagem de cães infectados nas regiões mais problemáticas. O risco é maior se o cão permanecer em regiões onde a prevalência é elevada, onde as condições climáticas são mais favoráveis (temperatura, humidade) ou se permanecer fora de casa desde o entardecer até ao amanhecer.
6 - Todos os Flebótomos transmitem Leishmaniose?Em Portugal encontram-se várias espécies do género phlebotomus. A espécie mais importante e eficaz na transmissão da Leishmaniose é o phlebotomus pernicious. Somente as fêmeas destes insectos transmitem a doença.
7 - Porque é que só os Flebótomos fêmea transmitem a Leishmaniose?
Ambos os sexos se alimentam do néctar das plantas, mas somente as fêmeas se alimentam do sangue dos mamíferos. A fêmea necessita do sangue para a postura dos ovos. Passada cerca de uma semana picada, a fêmea põe aproximadamente 1.000 ovos no solo ou locais húmidos e ricos em matéria orgânica.
8 - O que devo fazer se achar que o meu cão tem Leishmaniose?Deve levar o cão ao médico-veterinário o mais cedo possível, para que seja observado clinicamente e possa efectuar um ou mais exames complementares de diagnóstico para confirmar a presença ou a ausência da doença.
9 - Que métodos de diagnóstico existem?Resumidamente, utilizam-se técnicas que nos permitam detectar o parasita (parasitológicas) ou a presença de uma resposta imunológica. Podem utilizar-se várias técnicas simultaneamente a fim de assegurar o diagnóstico. Em zonas endémicas de Leishmaniose canina, os donos devem submeter rotineiramente os seus cães a exames para determinar se estão ou não infectados de forma a conseguir um diagnóstico precoce. Uma boa altura para o fazer é durante a consulta anual de revacinação.
10 - Qual a opinião dos cientistas sobre os produtos preventivos actualmente disponíveis comercialmente?
Vários cientistas têm reconhecido a eficácia das coleiras impregnadas de deltametrina. Prova disso é o facto da OMS ter recomendado, num relatório sobre doenças transmitidas por vectores, que “os donos devem ser encorajados a colocarem nos seus cães este tipo de coleiras”. Uma revisão, publicada recentemente, dos vários artigos científicos publicados nos últimos anos também refere que existem boas evidências para a recomendação da utilização em cães das coleiras impregnadas.
11 - Consigo proteger o meu cão a 100% das picadas do Flebótomo?
Nenhum produto pode oferecer um protecção de 100%. Uma protecção de 95% contra das picadas dos Flebótomos transmissores da Leishmaniose canina, durante um pouco mais de 6 meses, é a possibilidade mais elevada actualmente utilizando uma coleira especial.
12 - Posso contrair a doença se for picado por um insecto infectado?
É praticamente impossível que uma pessoa saudável venha a desenvolver sinais de Leishmaniose. No Homem, a resposta imunitária contra a Leishmania é muito mais eficaz do que no cão, sendo capaz de impedir a expressão da doença na grande maioria dos casos. Numa zona endémica, uma elevada percentagem de pessoas já contactou com o parasita alguma vez, mas, no entanto o número de casos clínicos é quase nulo. Mesmo que haja desenvolvimento de sintomas, o tratamento numa pessoa sem qualquer outro comprometimento tem uma elevada taxa de sucesso.
Leishmaniose (IV) - Brasil: um case study no controlo da leishmaniose
23/06
2011
às 22:51
No Brasil, os primeiros casos de leishmaniose foram detectados em 1940, no nordeste do país, tendo começado a alastrar-se a outras zonas a partir da década de 80 do século XX. Desde então, tem vindo a urbanizar-se, referiu Vera Camargo-Neves, investigadora da secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, no Primeiro Simpósio Leishmania realizado, no passado fim-de-semana, pela Intervet Shering-Plough, em Madrid (Espanha).
De acordo com a mesma investigadora, entre 2007 e 2009 foram detectados 1,98 casos de leishmaniose visceral (a mais grave) por cada 100 mil habitantes, com a taxa de mortalidade a situar-se nos 5,7%. A aspersão das habitações com insecticidas (que não comportam qualquer risco para o ser humano), por si só, não era suficiente para travar a expansão da doença, pelo que o Estado de São Paulo decidiu tomar outras medidas para reduzir o número de animais infectados com o parasita leishmania.
Vera Camargo-Neves, em parceria com especialistas da Universidade de São Paulo, lançaram uma experiência-piloto no município de Andradina, em 2002. Neste município, a taxa de incidência da leishmaniose humana era de 38 casos por cada 100 mil habitantes e a taxa de mortalidade de 21,1%. “O maior problema que enfrentávamos eram os cães assintomáticos”, sublinhou.
Seguindo as recomendações da Organização Mundial da Saúde, a experiência consistiu na aplicação de coleiras impregnadas com deltametrina a 4% em todos os cães do município, com e sem dono (no Brasil, os animais errantes são obrigatoriamente recolhidos nos canis municipais, sendo eutanasiados aqueles que se encontram doentes) e com idade superior aos três meses. Durante a o projecto, as coleiras foram mudadas a cada seis meses.
Em Outubro de 2002 tinham sido cadastrados 11.486 cães, 1245 estavam seropositivos. Um ano mais tarde, dos 8013 cães novamente rastreados, apenas 785 estavam seropositivos. E em Novembro de 2005, um ano depois dos animais terem deixado de utilizar a coleira, os resultados foram também satisfatórios: dos 7696 cães observados,326 estavam infectados.
A taxa de incidência nos seres humanos também foi sendo reduzida progressivamente: 34,1% (2002), 30,5% (2003), 3,6% (2004, quando foi colocada a última coleira nos cães) e 7,2% (2005, um anos depois dos animais terem deixado de usar a coleira). Vera Camargo-Neves não tem dúvidas: “Os resultados indicam que o uso destas coleiras é eficaz no controlo da doença quando associado a outras medidas de prevenção, tais como evitar os passeios, sobretudo entre o entardecer e o amanhecer, pois corresponde ao período de actividade dos mosquitos”. E acrescenta: “É importante assegurar um bom estado de saúde do animal, para proteger o seu sistema imunitário e manter uma boa alimentação, a vacinação em dia e a desparasitação regular”.
No dois dias de simpósio, médicos e veterinários de vários países (Portugal incluído) debateram as várias problemáticas relacionadas com a Leishmaniose canina e humana. Ao longo da semana iremos pubicar vários artigos sobre esta temática aqui, em Os Bichos.
O Jornal de Notícias viajou a convite da Intervet Shering-Plough Animal Health Portugal
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