sábado, 13 de junho de 2009

Luta por uma vacina

Ano de 1965. O professor Wilson Mayrink e o Epidemiologista Paulo Araújo Magalhães da SUCAN, iniciaram, em Caratinga (MG), estudos sobre a “Profilaxia da Leishmaniose Visceral” também conhecida como doença de Calazar. Viajavam de Belo Horizonte a Zona da Mata quando a noite começava a cair. Eles tinham pressa em chegar à cidade para conseguir uma boa noite de sono. No dia seguinte, antes das 5h, pesquisadores e equipe tinham de estar de pé prontos para a vacinação contra a Leishmaniose. O horário precisava ser o mais cedo possível porque os moradores da cidade e da região estariam indo trabalhar na lavoura, antes do sol aparecer.

Naquele tempo a imunização era para prevenir a população contra a Leishmaniose visceral
A partir de 1971, os esforços resultaram no controle da Salazar, e o professor Mayrink passou a coordenar um grande estudo, na mesma região de Caratinga, para testar a eficácia de uma vacina contra outro tipo da doença, a Leishmaniose Tegumentar Americana (LTA). Esse tipo leva à deformação da pessoa, através da decomposição de parte dos tecidos do corpo. São feridas que vão migrando da região infectada para outras partes do corpo.

Tantos anos depois, o trabalho do professor ainda continua, agora com novos objetivos. “A Leishmaniose só continua crescendo ainda hoje. Apesar de junto aos meus colegas termos certeza de que é possível prevenir essa doença só com a vacina. Mas nessas doenças que atingem praticamente só a população mais pobre, o investimento em pesquisa de campo é pequeno e a atenção dos órgãos fomentadores também é menor neste campo”, conta o professor.

O projeto, realizado com o apoio da UFMG, FAPEMIG e UFOP, atualmente está centralizado na cidade de Caratinga e atinge vários municípios vizinhos: Bom Jesus do Galho, Córrego Novo, Ubaporanga, Entre-Folhas e Imbé. Todos esses lugares são focos de Leishmaniose Tegumentar.

A princípio, foi feito um levantamento detalhado, com a colaboração do professor George Lins da UFOP, que mostrou, nos últimos dez anos, os principais focos localizados nestes municípios. Cada casa foi visitada e dados como número de residentes e casos de doença na família foram registrados no GPS. Ao todo 11.955 pessoas foram escolhidas para testar a vacina com o objetivo de criar uma imunização de modo a impedir que a doença se instale.

Algum tempo depois, começavam os preparativos para a vacinação. Antes, essas pessoas foram submetidas a um teste que avalia se elas possuem uma imunização natural contra a doença. Como a Leishmaniose Tegumentar é transmitida diretamente do reservatório para o mosquito (Lutzomia), ao longo da vida o povo dessa região é picado várias vezes por ele, na lavoura ou nas plantações. Se o homem é picado várias vezes mas recebe apenas pequenas doses do parasito, acaba desenvolvendo uma imunidade. Mas isso acontece só numa pequena parte da população, aproximadamente 5%, podendo atingir maiores níveis conforme o local.

O resultado saía 48 horas após a leitura do teste e, conforme eles iam sendo conferidos, as pessoas já recebiam a primeira dose da vacina. “Apareceram para tomar essa dose 7.792 pessoas. Muita gente faltou, outros tantos tinham morrido, se mudado dali ou apresentavam a imunidade natural”, explica Mayrink.

Decorridos 20 dias, já era hora de voltar ao local para aplicar a segunda e última dose da vacina, suficiente para completar a imunização. Mais uma vez, tudo pronto para receber a população, às 5h, antes de partir para a lavoura. Dessa vez apareceram 6.850 pessoas.

Desses vacinados, metade recebeu a vacina realmente e outra metade recebeu um placebo. Esse procedimento é comum na ciência, pois desse modo um grupo pode servir como comparativo para os resultados do outro. Esses dados e as informações sobre quem foram vacinados e se recebeu apenas a primeira dose ou ambas, eram acrescentados ao mapeamento.

Agora o projeto prossegue com o acompanhamento de toda a população vacinada ao longo dos anos, até 2007, para avaliar qual a eficiência da vacina na prevenção da doença nestes locais. Mas todo esse esforço já pode ser medido pelos primeiros resultados, que são bastante animadores. Entre os que receberam a vacina nesse projeto e outras quase 2 mil pessoas que já a haviam recebido em projetos de vacinação anteriores, desde 1990, foram contabilizados apenas cinco casos da doença. Isso sem esquecer que essas pessoas continuam morando numa região que é foco da Leishmaniose.

A vacina é produzida pelo próprio professor no Departamento de Parasitologia da UFMG, testada e padronizada pela Escola de Farmácia e CETEC. Apesar dos bons resultados obtidos ao longo dos anos, a vacina ainda não foi aprovada pelo Ministério da Saúde para prevenção da doença. Sua única aprovação é na forma terapêutica, como auxiliar aos medicamentos no combate da doença já instalada e muito tem ajudado em casos de doenças cardíacas, hepáticas, renais, em idosos, gestantes, etc.

“A situação hoje é complicada. Os médicos, por falta de contato com os pacientes nas enfermarias, estão mal-preparados para diagnosticar doenças como a Leishmaniose, a malária e esquistossomose, doenças que exames mais modernos não detectam. Por outro lado, há uma falta de boa-vontade em se testar e liberar medicamentos para essas doenças. E a população pobre, a mais afetada, acaba sofrendo até nisso”, completa o professor.

Contatos:
Professor Wilson Mayrink: (31) 3499-2849 / 2871

Fonte: Fundep

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